
A idade avançada limitou os movimentos de Ernesto de Paiva nos últimos anos Foto do arquivo de Walter Pereira
Maringá perdeu nesta sexta-feira o pioneiro Ernesto de Paiva, um de seus primeiros moradores. Ele tinha 92 anos e morreu de problemas decorrentes da idade avançada.
Morador em um belo sobrado da Zona 2 e proprietário de uma dúzia de fazendas, Paiva garantiu lugar na história de Maringá. Na primeira capela da cidade, a Santa Cruz, no Maringá Velho, tem tábuas que ele carregou, pregos que ele bateu; em frente ainda existe a casa de tábuas que ele construiu com as próprias mãos, a 16ª de Maringá; no centro da cidade ainda há prédios que ele construiu.
Mas ele é mais lembrado por ter trazido o primeiro automóvel da cidade, por ter criado a primeira padaria e por ter sido o corretor da Companhia Melhoramentos do Norte do Paraná que vendeu boa parte das propriedades rurais entre Mandaguari e Umuarama.
Mas, foi um bolo que mudou sua vida.
Paiva chegou à currutela aberta no meio da mata em 1944 e logo chamou a atenção. Ele tinha 21 anos e chegou dirigindo um Chevrolet Fleetline, que ficou parado em frente ao hotel do Periotto por falta de ruas para rodar.
Ele veio para visitar o pai, Oscar de Paiva, que tinha vindo quatro anos antes para abrir uma fazenda na Estrada Guaiapó para um plantador de café de São Paulo.
“Maringá tinha o hotel do Periotto, o comércio do Arlindo Planas, a pensão do Zé Maringá e as casinhas das primeiras famílias espalhadas numa área que equivale a quatro quarteirões”, me contou ele certa vez na varanda de seu sobrado, na Zona 2.
Quando já se preparava para voltar para São Paulo, ficou sabendo que a filha do dono do hotel ia casar e, como desde menino trabalhava em padaria, ofereceu-se para fazer uns docinhos.
Acabou fazendo o bolo da noiva e os poucos moradores da currutela e os muitos moradores das fazendas não o deixaram ir embora. Ofereceram-lhe condições para montar uma padaria. Assim nasceu a Arco-Íris, a primeira padaria de Maringá.
“Nos primeiros dias, desmanchava um saco de farinha. Pouco tempo depois já eram 10 sacos por dia”, citou, frisando que o aumento na produção foi resultado do crescimento rápido da cidade. Era gente que chegava para trabalhar nas fazendas da região ou para ficar na cidade.
Paiva ganhou muito dinheiro, participou de tudo no início da história e viu a mata indo abaixo para o nascimento de uma cidade, que se espalhou Avenida Brasil afora.
Quem tinha mais dinheiro ia morar nas zonas 5, 4 e 2; os trabalhadores foram para a Zona 3 (Operária) e Zona 7 e o comércio se instalou ao longo das avenidas Brasil, Duque de Caxias e Getúlio Vargas, que ainda não tinham esses nomes.

Foto antiga, da época em que o jovem Ernesto trocou a vida de padeiro pela de fazendeiro Arquivo Walter Pereira
E ele também desceu a avenida. Vendeu o prédio de sua padaria a uma família de japoneses que montou a Relojoaria Omega e foi para o Maringá Novo, onde construiu a Arco-Íris no centro, na esquina da Brasil com Rua General Câmara, hoje Basílio Saltchuk.
Foi como o único padeiro da cidade por muitos anos que Paiva conheceu todo mundo que chegava. Dando dicas para um e para outro sobre as melhores terras, acabou convidado pelo dono da Melhoramentos, Alfredo Werner Nyffeler, para ser corretor da companhia.
Foi a desistência de continuar com a padaria que o transformou em fazendeiro. Ele negociou a Arco-Íris com o pioneiro Hilário Alves, dono do Hotel Indaiá e da esquina em que estava a padaria, recebendo em troca uma área de 30 alqueires onde hoje é Mandaguaçu.
“Eu não queria terra, não sabia mexer com aquilo, mas fui aconselhado a topar o negócio. Já tinha café plantado e o Hilário achava que ia dar 3 mil sacas. Deu o dobro e aí me apaixonei por terra”, disse, citando que logo comprou outra área maior em Mandaguaçu e depois uma fazenda em Terra Boa, cujo cafezal por muitos anos foi usado pela Melhoramentos como referência para quem chegava para adquirir terras.
Ernesto de Paiva viveu mais de 70 anos em Maringá, viu tudo acontecer e sempre dise que não vivia do passado, mas lembrava com saudades daqueles tempos em que tudo era difícil, mas o espírito de aventura e a esperança compensavam.
“Não tinha telefone, nem energia elétrica, água só de poço caipira, as estradas eram poucas e se chovesse ninguém passava, mas havia muita vontade de trabalho, todos que chegavam eram jovens, tinham muita energia, sonhos, projetos de vida. E a cidade recebeu a todos de braços abertos. Aqueles que sonharam sério tiveram sucesso”.
O corpo de Ernesto de Paiva está sendo velado na Capela do Prever do Cemitério Parque. O sepultamento está marcado para as 9h30.